quinta-feira, 22 de agosto de 2013

O meu espanhol... ¡Hay más días que longaniza!

<<Tenemos un mes para visitar París, o sea, que no vamos a ver todo em uma semana, que hay más días que longaniza.>>



O dito popular é pouco usado e recomenta economia e paciência. Aconselha saber esperar a situação mais propícia para fazer algo; ser cauteloso e não precipitar os acontecimentos. Ou seja, o nosso famoso: A vida não é feita de um dia!

Este provérbio teria origem "gastronômica"! Sim, porque alude à necessidade de poupar a comida em época de escassez. Com este sentido é encontrado nas obras do Marqués de Santillana (1398-1458) e Sebastián de Covarrubias.

(fontes: Centro Virtual Cervantes - Academic Dicionários e Enciclopédias)




terça-feira, 13 de agosto de 2013


O mel silvestre
Horacio Quiroga
 

Tradução: Renata C.B. Moreno.
Conto extraído da antologia “Cuentos de amor locura y de muerte”, publicada em 1917.

 


Tenho em Salto Oriental dois primos, hoje homens já, que aos seus doze anos, e em consequência de profundas leituras de Júlio Verne, deram na rica empreitada de abandonar sua casa para ir viver no monte. Este fica a duas léguas da cidade. Ali viveriam primitivamente da caça e pesca. Verdade é que os dois meninos não tinham lembrado, particularmente, de levar espingardas nem anzóis; mas, de qualquer maneira, o bosque estava ali, com sua liberdade como fonte de felicidade, e seus perigos como encanto.

Desgraçadamente, no segundo dia foram achados por quem os buscava. Estavam bastante atônitos ainda, bem fracos, e para grande assombro de seus irmãos menores – iniciados também em Júlio Verne – sabiam ainda andar em dois pés e recordavam como falar.

A aventura dos dois ermitões, no entanto, seria talvez mais formal se tivessem tido como teatro outro bosque menos domingueiro. As escapadelas levam aqui a limites imprevistos em Misiones, e o orgulho de suas stromboot[I1  arrastou Gabriel Benincasa a esses limites.

Benincasa, tendo concluído seus estudos de contadoria pública, sentiu fulminante desejo de conhecer a vida na selva. Não foi arrastado por seu temperamento, pois antes Benincasa era um rapaz pacífico, gorducho e de cara rosada, em razão de sua excelente saúde. Em consequência, sensato o suficiente para preferir um chá com leite e bolinhos a quem sabe que fortuita e infernal comida do bosque. Mas assim como o solteiro que foi sempre ajuizado  crê no seu dever de, à véspera de seu casamento,  despedir-se da vida livre com uma noite de orgia em companhia de seus amigos, de igual modo Benincasa quis honrar sua vida engrenada com dois ou três choques de vida intensa. E por este motivo subia o Paraná até uma obrage, com suas famosas stromboot.

Mal saído de Corrientes havia calçado suas robustas botas, pois os jacarés da margem esquentavam já na paisagem. Mas apesar disso o contador público cuidava muito de seu calçado, evitando arranhões e  contatos sujos.

Deste modo chegou à obrage de seu padrinho, que na hora teve  que conter os impulsos         de seu sobrinho.

– Aonde vai agora? – tinha perguntado surpreendido.

– Ao monte; quero percorrê-lo um pouco – respondeu Benincasa, que acabava de  pendurar a winchester no ombro.

–Mas, infeliz! Não vai poder dar um passo. Segue a trilha, se quiser... Ou melhor, deixa essa arma, e amanhã mandarei um peão te acompanhar.

Benincasa renunciou ao seu passeio. Contudo, foi até a margem do bosque e se deteve. Tentou vagamente um passo adentro, e ficou quieto. Meteu as mãos nos bolsos e olhou detidamente aquele inextricável emaranhado, assobiando fracamente trechos incompletos. Após observar de novo o bosque de um lado ao outro, retornou bastante desiludido.

No dia seguinte, no entanto, percorreu a trilha central por cerca  de uma légua, e ainda que seu fuzil voltasse profundamente dormido, Benincasa não lamentou o passeio. As feras chegariam pouco a pouco.

Estas chegaram  na segunda noite, ainda que de um modo  um pouco singular.

Benincasa dormia profundamente, quando foi acordado por seu padrinho.

–Ei, dorminhoco! Levanta que vão te comer vivo.

Benincasa se sentou bruscamente na cama, alucinado pela luz dos três lampiões de vento que se moviam de um lado a outro no quarto. Seu padrinho e dois peões regavam o andar.

– O que foi, o que foi? –perguntou, jogando-se ao chão.

–Nada... Cuidado com os pés... A correição.

Benincasa já tinha   se inteirado das curiosas formigas a que chamamos correição. São pequenas, negras, brilhantes e marcham velozmente em rios mais ou menos largos. São essencialmente carnívoras. Avançam devorando tudo que encontram pelo caminho: aranhas, grilos, escorpiões, sapos, víboras, e todo ser que não pode lhes resistir. Não há animal, por grande e forte que seja, que não fuja delas. Sua entrada em uma casa supõe a exterminação absoluta de todo ser vivo, pois não há rincão nem buraco profundo onde não se precipite o rio devorador. Os cães uivam, os bois mugem, e é forçoso abandonar a casa, em troca de ser roído em dez horas até o esqueleto. Permanecem no lugar um, dois, até cinco dias, segundo sua riqueza em insetos, carne ou gordura. Uma vez devorado tudo, se vão.

Mas não resistem à creolina ou droga similar; e como na obrage havia muita creolina, em menos de uma hora o chalé ficou livre da correição.

Benincasa observava muito de perto, nos pés, a placa lívida de uma mordida.

– Picam muito forte, realmente! – disse surpreendido, levantando a cabeça para seu padrinho.

Este, para quem a observação não tinha já nenhum valor, não respondeu, felicitando-se, em compensação, de ter contido a tempo a invasão. Benincasa retomou o sono, ainda que sobressaltado toda a noite por pesadelos tropicais.

No dia seguinte foi ao monte, desta vez com um facão, pois tinha acabado de compreender que tal utensílio lhe seria bem mais útil no monte que a espingarda. É verdade que seu pulso não era maravilhoso, e sua pontaria muito menos. Mas, de qualquer maneira, conseguia quebrar os ramos, açoitar a cara e cortar as botas; tudo em um.

O monte crepuscular e silencioso o cansou cedo. Dava-lhe a impressão - exata por demais – de um cenário visto de dia. Da agitada vida tropical não há a essa hora mais que o teatro gelado; nem um animal, nem um pássaro, nem um ruído quase. Benincasa voltava quando um surdo zumbido lhe chamou a atenção. A dez metros dele, em um tronco oco, diminutas abelhas aureolavam a entrada do buraco. Se aproximou com cautela e viu no fundo da abertura dez ou doze bolas escuras do tamanho de um ovo.

– Isso é mel – disse o contador público com íntima gula - Devem ser bolsinhas de cera, cheias de mel...

Mas entre ele, Benincasa, e as bolsinhas, estavam as abelhas. Após um momento de descanso, pensou em fogo: levantaria uma boa fumaceira. A sorte quis que enquanto o ladrão se aproximava cautelosamente da folharada úmida, quatro ou cinco abelhas pousassem em sua mão, sem o picar. Benincasa logo apanhou uma  e,  oprimindo seu abdômen, constatou que não tinha ferrão. Sua saliva, já leve, se purificou em melífica abundância. Maravilhosos e bons animaizinhos!

Em um instante o contador desprendeu as bolsinhas de cera, e afastando-se um bom trecho para escapar do pegajoso contato das abelhas, se sentou em uma grande raiz. Das doze bolas, sete continham pólen. Mas as restantes estavam cheias de mel, um mel escuro, de sombria transparência, que Benincasa saboreou gulosamente. Tinha um gosto distinto. De quê? O contador não pôde explicar. Talvez resina de frutas ou de eucalipto. E por igual motivo,  o denso mel tinha um vago sabor áspero. Mas, em compensação, que perfume!

Benincasa, uma vez bem seguro de que só cinco bolsinhas lhe seriam úteis, começou. Sua ideia era singela: colocar o favo gotejante suspenso sobre sua boca. Mas como o mel era espesso, teve que aumentar o buraco, depois de ter permanecido meio minuto com a boca inutilmente aberta. Então o mel surgiu, afinando-se em pesado fio até a língua do contador.

Um depois do outro, os cinco favos se esvaziaram assim, dentro da boca de Benincasa. Foi inútil que ele prolongasse a suspensão, e muito mais que repassasse os balões exaustos; teve que resignar-se.

Enquanto isso, a sustentada posição da cabeça ao alto tinha-o enjoado um pouco. Pesado de mel, quieto e os olhos bem abertos, Benincasa considerou de novo o monte crepuscular. As árvores e o solo tomavam posturas por demais oblíquas, e sua cabeça acompanhava o vaivém da paisagem.

– Que enjoo curioso... – pensou o contador. - E o pior é...

Ao levantar-se e tentar dar um passo, se viu obrigado a cair de novo sobre o tronco. Sentia seu corpo de chumbo, sobretudo as pernas, como se estivessem imensamente inchadas. E os pés e as mãos formigavam.

– É muito estranho, muito estranho, muito estranho! – repetiu estupidamente Benincasa, sem suspeitar, no entanto, do motivo dessa estranheza - Como se tivesse formigas... A correição – concluiu.

E de repente a respiração se cortou seca, de espanto.

– Deve de ser o mel...! É venenoso...! Estou envenenado!

E num segundo esforço para levantar-se, seu cabelo arrepiou-se de terror: não podia nem se mover. Agora a sensação de chumbo e o formigamento subiam até a cintura. Durante um tempo o horror de morrer ali, miseravelmente só, longe de sua mãe e seus amigos, lhe coibiu todo meio de defesa.

– Vou morrer agora...! Daqui a pouco vou morrer...! Já não posso mover a mão...!

Em seu pânico constatou, no entanto, que não tinha febre nem ardor de garganta, e o coração e pulmões conservavam seu ritmo normal. Sua angústia mudou de forma.

– Estou paralítico, é a paralisia! E não vão me encontrar...

Mas uma visível sonolência começava a apoderar-se dele, deixando-lhe íntegras suas faculdades, ao mesmo tempo em que o enjoo  acelerava. Assim, pensou notar que o solo oscilante ficava negro e se agitava vertiginosamente. Outra vez veio à sua memória a lembrança da correição, e em seu pensamento se fixou como uma suprema angústia a possibilidade de que esse negror que invadia o solo...

Teve ainda forças para se arrancar desse último espanto, e de repente lançou um grito, um verdadeiro alarido em que a voz do homem recupera a tonalidade do menino aterrorizado: por suas pernas subiam um precipitado rio de formigas negras. Ao redor dele a correição devoradora escurecia o solo, e o contador sentiu por baixo da cueca o rio de formigas carnívoras que subiam.

Seu padrinho achou-o finalmente, dois dias depois, e sem a menor partícula de carne, o esqueleto coberto pela roupa de Benincasa. A correição que vagava ainda por ali e as bolsinhas de cera o esclareceram suficientemente.

Não é comum que o mel silvestre tenha essas propriedades narcóticas ou paralisantes, mas pode acontecer. As flores com igual caráter abundam no trópico, e já o sabor do mel denuncia na maioria dos casos sua condição – tal como deixou a resina de eucalipto que Benincasa achou sentir.


 [I]corruptela de stormboot, botinas à prova d’água para uso em tempestades
 
 

Grandes nomes da literatura hispano-americana: Horacio Quiroga

Horacio Silvestre Quiroga Forteza nasceu em Salto, Uruguai, em 31 de dezembro de 1878, e morreu em Buenos Aires, Argentina, em 19 de fevereiro de 1937. É considerado um dos maiores contistas latino-americano de todos os tempos. Um escritor excêntrico e fascinante que conduziu com destreza a arte da narração e influenciou outros escritores como Julio Cortázar e Juan Carlos Onetti. A maioria de seus contos é ambientada no espaço selvático das fronteiras entre Argentina, Paraguai e Brasil, local onde viveu longos anos. “Conto de amor de loucura e de morte” e “Os desterrados” são suas mais importantes obras. Os relatos revelam um gênero sombrio que envolve os aspectos mais estranhos da natureza e, com frequência, matizados de horror, doença e sofrimento. Leitor voraz de Edgar Allan Poe e Guy de Maupassant, Horacio Quiroga uniu-se a escola modernista e deixou uma vasta obra em contos, algumas poesias, duas novelas, além de críticas literárias e para o cinema. Mestre incomparável, Quiroga idealizou sua produção literária a partir da experiência vivencial. Dentre todos os contos que nasceram do aguçado e sombrio imaginário do escritor uruguaio, é difícil encontrar um que seja tão trágico como sua própria vida marcada por tragédias. Com apenas dois meses de vida, seu pai morreu vítima de um disparo acidental de sua própria arma. Sua mãe casa-se novamente, e Quiroga passa a nutrir grande afeto pelo padrasto, porém ante o terrível sofrimento causado por uma paralisia cerebral, o padrasto suicida-se com um tiro quando o escritor tinha ainda 12 anos. Em 1901, ano da publicação de seu primeiro livro, “Os arrecifes de coral”, seus irmãos Pastora e Juan Prudencio, morrem vítimas da febre tifoide. No ano seguinte, em 1902, outro trágico e derradeiro episódio marca para sempre a vida do jovem escritor: seu melhor amigo, Frederico Ferrando é fortemente criticado por um jornalista montevideano e comunica ao amigo seu desejo de duelar com o mesmo. Quiroga se oferece para explicar o funcionamento da arma que seria usada na disputa, quando a mesma subitamente dispara atingindo Frederico e matando-o imediatamente. Após a morte de seu melhor amigo, Quiroga muda-se para Buenos Aires em 1903 e começa a dar aulas de espanhol no Colégio Britânico. Em 1906 é nomeado professor de literatura na Escola Normal nº 8, onde conhecerá sua primeira esposa, Ana María Cirés. Em 1910, já casado, Quiroga abandona o magistério e passa a morar em San Ignacio. Em 29 de janeiro de 1911, em sua própria casa, unicamente amparada pelo marido e em meio à selva de Misiones, Ana Maria dá à luz a primeira filha do casal Eglé Quiroga. Em fevereiro de 1912, nasce Darío Quiroga, segundo filho do casal, em um hospital em Buenos Aires. Porém, os conflitos conjugais e as discussões entre o casal são constantes, Ana não se adapta à vida difícil e ao isolamento na selva de Misiones, e suicida-se, em 1915, ingerindo um tipo de veneno conhecido como “sublimado corrosivo” (cloreto de mercúrio). Em 1916 Quiroga retorna à Buenos Aires com seus filhos e por influência de amigos é nomeado contador do Consulado Geral do Uruguai. Em 1926, Horacio conhece a jovem María Elena Bravo, amiga de sua filha Eglé, com quem se casa em 16 de julho de 1927. Ela com menos de vinte anos de idade e ele próximo aos cinquenta... No ano seguinte nasce a única filha do casal, María Helena Quiroga, a “Pitoca”. Mais uma vez, a difícil vida no isolamento da selva gera conflitos conjugais e María Elena retorna a Buenos Aires com a filha, abandonando o escritor na solidão da selva. Em setembro de 1936, acometido por fortes dores estomacais, o escritor vai para Buenos Aires, onde é internado no Hospital de Clínicas e diagnosticado com um câncer gástrico irremediável. Em 18 de fevereiro de 1937, aos cinquenta e oito anos, Horacio Quiroga tira a própria vida ingerindo cianureto. Seu corpo é velado na sede da Sociedade Argentina de Escritores e após ser cremado, suas cinzas são transportadas para Salto, sua cidade natal. Um ano após sua morte, Eglé Quiroga, filha mais velha do autor, com apenas vinte e sete anos de idade suicida-se após receber o diagnóstico de um tumor maligno. Em 1951, Darío Quiroga, em um rompante de desespero, suicida-se e em 1988 foi a vez de “Pitoca”, aos setenta anos de idade.
 
“No se conoce creador alguno de cuentos campesinos, mineros, navegantes, vagabundos, que antes no hayan sido, con mayor o menor eficacia, campesinos, mineros, navegantes y vagabundos profesionales.” (Quiroga - “Decálogo del perfecto cuentista”)

Tá com bicho carpinteiro?



Os professores e pais que nos digam, pois devem rezar todos os dias para que os cientistas descubram, de uma vez por todas, como “dedetizar” as crianças contra esse tal: “bicho carpinteiro”. Porque parece ser ele o culpado das agitações, corre-corre, travessuras e inquietações da criançada! 

Mas, pobre coitado do bichinho, ele não tem culpa nenhuma e tudo decorre da espantosa capacidade humana de ouvir mal e transformar as expressões em absurdas e engraçadas. 

As crianças, e até mesmo adultos, quando ficam, ou são, inquietos, é porque parecem ter “bicho no corpo inteiro”, como se estivessem sendo roídas por dentro!!! (Reinaldo Pimenta, A casa da mãe Joana, editora Campus) E isso não significa que são “bichos carpinteiros”, que, aliás, preferem outras iguarias... Este tipo de cupim rói troncos e cascas de árvores com incrível persistência.