“Naquele dia, a cidade ainda
dormia ou ia se levantando lentamente. Apesar de São Paulo se vangloriar de ser
o maior centro industrial da América Latina, como anunciavam seus vermelhos
bondes ‘camarão’, o silêncio e a modorra se explicavam: não se tratava de uma
quarta-feira qualquer, e sim de uma Quarta-Feira de Cinzas, após três dias de
carnaval.
Mas nem tudo estava parado. Os
lixeiros percorriam as ruas, recolhendo os restos da folia no centro da cidade.
Cacos de vidro de lança-perfumes, serpentinas emaranhadas, garrafas de cerveja,
iam sendo lançados nos caminhões de lixo, embora fosse difícil apagar todos os
vestígios de uma festa que introduzira uma cunha brejeira na marcha cotidiana
da cidade sisuda.
Dentre os vestígios, os confetes
coloridos teimaram em ficar grudados ao asfalto, resistindo às vassouras dos
lixeiros até que fossem arrastados pelas chuvas fortes de verão.”
(“O Crime do Restaurante Chinês”
- Boris Fausto)
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